segunda-feira, 30 de agosto de 2010

A história de um velho lenhador

Era uma vez, aconteceu um fato insólito em Miho (hoje província de Gifu). Havia um velho lenhador que morava junto com sua velha companheira, numa pequena casinha ao pé da montanha. Apesar de pobres, viviam agradecendo aos deuses da Natureza por ter lhes dado muita saúde e longa vida. Seu único lamento era o de não ter tido filhos na juventude. Agora, com a idade avançada, sentiam uma inexplicável solidão. Como se faltasse algo para preencher os últimos anos de suas vidas. Para consolar o irremediável, o casal mergulhava nas lembranças românticas e trazia à tona saudosos momentos dos tempos dourados da mocidade.

Certa ocasião, o velho lenhador saiu para catar galhos de árvores no mato e, levado por nostálgicas lembranças, resolveu percorrer as antigas trilhas do seu passado como jovem lenhador. À medida que caminhava, foi notando que a paisagem estava se tornando diferente do que conhecia, até que, em dado momento, já não sabia onde estava.

Cansado de andar, parou junto a uma fonte de águas cristalinas e resolveu matar a sua sede. Com as mãos em formato de concha, bebeu lentamente aquela água gostosa, que desceu banhando sua seca garganta. De repente, sentiu que sua canseira havia desaparecido e que seu corpo experimentava uma sensação de vigor há décadas perdida.

O lenhador olhou para sua imagem refletida na água e levou um susto. Sua farta barba branca havia desaparecido juntamente com as rugas. No lugar da pele flácida e enrugada, vibravam músculos cheios de energia. Um milagre! O velhinho havia recuperado toda a sua mocidade! Estava novamente com aspecto de quem tem 18 a 20 anos!

Feliz da vida, com um sorriso que só os descobridores da fonte da juventude possuem, o lenhador voltou para casa cantarolando.

Lá chegando, quase matou a velhinha de susto. Ela não acreditava no que via. Aquele moço lindo, por quem se apaixonara há cerca de 50 anos, estava sorridente em carne e osso a sua frente.

O “ex-velhinho” tratou de tranqüilizá-la contando toda sua milagrosa história. A velha botava as mãos na cabeça e dizia, eufórica: “Onde fica essa fonte? Dessa água eu beberei aos montes!”. O lenhador explicou o caminho detalhadamente e foi dormir. Queria descansar, pois a carga emocional havia sido demais para um dia só.

Antes mesmo de o sol raiar, a velhinha saiu em busca da juventude perdida. Ela chorava e ria ao mesmo tempo. Não conseguira dormir, pois estava ansiosa em saber que também se tornaria bela e formosa.

Ao despertar com o canto dos pássaros, o lenhador percebeu que sua mulher tinha saído em busca do rejuvenescimento nas límpidas águas da milagrosa fonte e ficou em casa preparando um gostoso almoço para comemorar uma nova lua-de-mel. Porém, o tempo foi passado, passando, passando, a comida esfriando, esfriando, esfriando, e nada de a velhinha voltar. Não agüentando mais a pressão da ansiedade, o velhinho remoçado correu para a floresta.

Gritou chamando a velhinha, porém somente o eco respondeu o seu apelo.

Horas depois, cansado de tanto procurar pela companheira, ele fez uma pausa. Desiludido na procura, o lenhador aproximou-se da fonte para descansar. Nisso, ouviu, em um arbusto, o choro de um bebê. No primeiro momento, pensou que se tratava de sua imaginação, mas, como o choro persistia, resolveu verificar.

Entre as folhagens que margeavam a fonte, havia uma criança abandonada. “Uma menina com poucos meses de vida. Quem teria feito uma coisa desalmada dessas?” Pensando isso, o lenhador pegou o bebê.

A menina era tão novinha, que ainda não sabia falar, mas havia um magnetismo em seus olhos que revelava uma experiência de longa data. Tomado de profunda emoção, o moço entendeu tudo:

– Essa não! É você, minha velhinha! Foste muito afoita à fonte e bebeste água demais. A sede da eterna juventude fez você beber com exagero, agora és uma recém-nascida!

O lenhador deu um suspiro e caminhou de volta para casa. O amor romântico que o casal tanto sonhara não seria mais possível. Com a menina nos braços enquanto caminhava, o rejuvenescido lenhador começou sentir um amor paterno. Compreendeu que era hora de cuidar e proteger, como pai, aquela que, por tanto tempo, foi sua companheira. Um presente da natureza: uma filha que nunca tivera a oportunidade de ter.


(Autor : Claudio Seto)

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